quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Nota sobre um Poema de Eleazar Venancio Carrias


Metafísicos_1

Quando eu vagava
Alta madrugada
Nas ruas de Berlim,
Nenhuma metafísica
Se eriçava
Contra mim.

Toda dúvida se diluía
Em meia garrafa de vodka.
Seguir a calçada de pedra
era a única lógica.
(blog: Coração Pervasivo)

O poema “Metafísicos_1” de Eleazar Venancio Carrias – publicado em seu blog “Coração Pervasivo” em 25 de Abril de 2011 – possui duas estrofes: uma sextilha e um quarteto. É um poema breve de versos curtos. Contudo, sua organicidade alcança a plenitude do estado de entendimento deflagrado pela embriaguez.
Berlim é o lugar escolhido para o eu lírico bêbado passear, local de referência na história e capital de um dos polos de desenvolvimento da filosofia e cultura ocidental. Lugar carregado de passado grave à historia do pensamento (Kant; Benjamin; Heidegger;...), entretanto este passado não pesa nos ombros do eu lírico entorpecido (Nenhuma metafísica/ se eriçava/ contra mim.)
Constituição intima das coisas...”/“Sentido íntimo do universo...”; Este estado de perplexidade ridicularizado por Alberto Caeiro não o atormenta. Estar bêbado é o melhor modo de entender o mundo; estando débil e ridículo ao cambalear pelas ruas, sendo a única preocupação manter-se na calçada. Este estado responde as perguntas da metafísica, pois a lógica está no que é de mais superficial e simples (seguir a calçada de pedra).
Contudo este poema curto não é superficial, mesmo sendo simples; nem tão óbvio. Sua linguagem é a do cotidiano; sem metáforas surrealistas ou jogos barrocos de raciocínio e reflexão. O poema, assim como praticamente toda poesia de Venâncio, não se baseia nestes recursos, ele é rico em reflexões imagéticas. O contraste entre a preocupação rigorosa e grave sobre o caminho da humanidade exercida pela filosofia e a preocupação tola de um débil bêbado em seguir seu caminho pela calçada.
       Poema curto que dialoga com Alberto Caeiro em “O Guardador de Rebanhos”, no qual os questionamentos metafísicos não revelam o mundo, mas o distorce e cega o homem diante do mais importante: “Quem está ao sol e fecha os olhos, / Começa a não saber o que é o sol, / E ao pensar muitas coisas cheias de calor”.
        O ponto chave neste poema é o alcance da lucidez pelo poeta ao ignorar o questionamento sobre o homem e o mundo. O poeta está lúcido ao se entorpecer pela vida preocupando-se em realizar o que é mais cotidiano, manter-se em pé e caminhar em linha reta, talvez tentando manter alguma dignidade pelo caminho. Ele, diante das questões filosóficas, as ignora na sua embriaguez.