Metafísicos_1
Quando eu vagava
Alta madrugada
Nas ruas de Berlim,
Nenhuma metafísica
Se eriçava
Contra mim.
Toda dúvida se
diluía
Em meia garrafa de
vodka.
Seguir a calçada de
pedra
era a única lógica.
(blog: Coração Pervasivo)
O poema
“Metafísicos_1” de Eleazar Venancio Carrias – publicado em seu
blog “Coração Pervasivo” em 25 de Abril de 2011 – possui duas
estrofes: uma sextilha e um quarteto. É um poema breve de versos
curtos. Contudo, sua organicidade alcança a plenitude do estado de
entendimento deflagrado pela embriaguez.
Berlim é o lugar
escolhido para o eu lírico bêbado passear, local de referência na
história e capital de um dos polos de desenvolvimento da filosofia e
cultura ocidental. Lugar carregado de passado grave à historia do
pensamento (Kant; Benjamin; Heidegger;...), entretanto este passado
não pesa nos ombros do eu lírico entorpecido (Nenhuma metafísica/
se eriçava/ contra mim.)
“Constituição
intima das coisas...”/“Sentido íntimo do universo...”; Este
estado de perplexidade ridicularizado por Alberto Caeiro não o
atormenta. Estar bêbado é o melhor modo de entender o mundo;
estando débil e ridículo ao cambalear pelas ruas, sendo a única
preocupação manter-se na calçada. Este estado responde as
perguntas da metafísica, pois a lógica está no que é de mais
superficial e simples (seguir a calçada de pedra).
Contudo este poema
curto não é superficial, mesmo sendo simples; nem tão óbvio. Sua
linguagem é a do cotidiano; sem metáforas surrealistas ou jogos
barrocos de raciocínio e reflexão. O poema, assim como praticamente
toda poesia de Venâncio, não se baseia nestes recursos, ele é rico
em reflexões imagéticas. O contraste entre a preocupação rigorosa
e grave sobre o caminho da humanidade exercida pela filosofia e a
preocupação tola de um débil bêbado em seguir seu caminho pela
calçada.
Poema curto que
dialoga com Alberto Caeiro em “O Guardador de Rebanhos”, no qual
os questionamentos metafísicos não revelam o mundo, mas o distorce
e cega o homem diante do mais importante: “Quem está ao sol e
fecha os olhos, / Começa a não saber o que é o sol, / E ao pensar
muitas coisas cheias de calor”.
O ponto chave neste
poema é o alcance da lucidez pelo poeta ao ignorar o questionamento
sobre o homem e o mundo. O poeta está lúcido ao se entorpecer pela
vida preocupando-se em realizar o que é mais cotidiano, manter-se em
pé e caminhar em linha reta, talvez tentando manter alguma dignidade pelo caminho. Ele, diante das questões filosóficas,
as ignora na sua embriaguez.
“O artista estaria sozinho, numa relação entre ele e o que faz, sem mediador. Isso é carência. Por quê? Porque sempre, em todos os tempos, a obra chega ao público através de um pensamento outro, que não é o pensamento do artista. Um outro de compreensão, seja aprovadora ou seja de oposição, que ajuda a formar ideia sobre o produzido. Em outros meios, a presença da crítica se manifesta, ainda que esporadicamente. Entre nós, nem isso. Ora, não se trata apenas da falta de ressonância do que se faz. O que se faz não encontra um pensamento exterior que venha ao seu encontro para confirmá-lo ou denegá-lo. As obras se produzem, são exposta e em torno delas não há palavras. Elas ficam sem vida, destituídas da história. Ao artista falta seu outro; em torno dele não se forma a comunidade de diálogo que o transporta ao futuro.”(Benedito Nunes em Asas da Palavra)
ResponderExcluirParabéns Luiz, acredito na importância da memória assim como na importância de vivenciar o tempo de hoje, esse teu testemunho é uma uma iniciativa ousada e que soubeste conduzir muito bem. Teu texto prendeu minha atenção, do ínicio ao fim. Acho inclusive que textos assim deveriam estar no jornal( Mas quem lê jornal de fato, Érika?Quem lê? Poucos, eu sei...mas isso é outra discussão), tanta coisa sendo produzida, é preciso dialogar, reconhecer isso.
Muito obrigado mana, vc é uma grande companheira, agradeço por tudo :D
ExcluirAh, outra coisa … a metafísica sempre rendendo boas discussões, essa danada!
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